Morrer, pensar, escrever: pactos do eu autoral

Abstract
O poeta pensa na palavra e nela morre. O poeta “morre de pensar” (Quignard) e morre de escrita. Pensar, morrer, escrever são atos em simultâneo ao efeito da escrita e a qualquer distância da morte. Por vezes uma forte experiência de desamparo pode iluminar a vertigem deste encontro que permite ao autor encenar-se como “morto”. É o que ocorre com Blanchot num texto curto e híbrido entre ficção e escrita de si – O instante da minha morte -, que motivou Derrida a escrever um longo ensaio. Morto desde que enunciado, o autor se dobra a serviço do que lhe advém: um novo eu e um novo real que o pensamento permite pela escrita. Ceder ao incognoscível é desaparecer e deixar que corpo e ideias façam o seu trabalho na encenação de uma “inconcreta” morte. Assim como o sonho, o pensamento se produz a partir de conceitos/palavras que inventam liames e sentidos entre as imagens dispersas, lugar onde somos/estamos desde sempre perdidos. Em torno do exposto, o artigo pretende refletir sobre a escrita em conexão com a morte, a partir do pensamento de Blanchot e alguns antecessores (Hegel, Valéry), com o objetivo de abordar, não só a especificidade do literário, mas ainda algum aspecto não-literário da linguagem, catalogado como testemunhal, de modo a encontrar a indecidibilidade. No lugar de limites, acena-se ao conceito de limiares para investigar alguns pactos do eu autoral, em Herberto Helder, Gonçalo M. Tavares e no próprio Blanchot.